Portugal pode orgulhar-se por ter na sua história um dos maiores génios da escrita e do pensamento de todos os tempos: Fernando Pessoa. Pensamento global e ação local é aquilo que, hoje, chamamos de GLOCAL.
Se perguntarmos ao Google pelo termo GLOCAL, ele envia-nos para a Wikipédia que nos diz que “Glocalização é um neologismo resultante da fusão dos termos global e local. Refere-se à presença da dimensão local na produção de uma cultura global.” Não sendo este um termo emergente dos tempos modernos e digitais, a primeira referência ao termo GLOCAL dá-se na década de 80, sendo consagrada no “The Oxford Dictionary of New Words”, referindo-se ao processo de “telescoping global and local to make a blend”, diz a Wikipédia. E continua dizendo que o conceito nasce no vocabulário japonês “dochakuka” referindo-se à necessidade de adaptar técnicas agrícolas inovadoras às condições de produção locais. Refere que o primeiro autor a explicar a ideia de GLOCAL é Roland Robertson, um sociólogo inglês dedicado ao estudo da globalização, nascido em 1938, que em 1992 assume o termo GLOCAL como sua propriedade.
Mas há um “mas” para a Wikipédia e para alguns dos autores conceptuais da disciplina de marketing.
Muito antes dos anos 80, precisamente em 1926, ainda Roland Robertson não havia nascido, há um português que se antecipa e descreve o conceito GLOCAL na perfeição.
O seu nome é Fernando Pessoa.
Num artigo de título “A Essência do Comércio”, publicado na “Revista de Comércio e Contabilidade”, precisamente a 25 de janeiro de 1926, Pessoa toma como exemplo a notícia de um caso curioso que aconteceu na Inglaterra, para descrever a importância da ação local num pensamento global de negócio. Os “egg-cups que se vendiam na índia”, é um caso que retrata a forma como os alemães ultrapassaram os ingleses na exportação de taças de ovos para a India, pelo simples facto de terem estado atentos ao tamanho dos ovos das galinhas indianas, maiores que os das galinhas inglesas e, eventualmente, europeias! Os alemães notaram isso, fizeram taças maiores, à medida dos ovos indianos, embalaram o produto e fizeram-no chegar ao seu destino com a qualidade e o preço a que os ingleses habituaram o mercado. Sucesso!
Os ingleses só deram pelo sucedido quando viram a procura pelo seu produto descer até zero. O que é que falhou aqui? Naturalmente um pensamento GLOCAL, tal como Fernando Pessoa bem explica no dito artigo, naquela época:
“(…) Esta história, em aparência tão simples, encerra um ensinamento que todo comerciante, que o não seja simplesmente por brincar às vendas, devia tomar a peito compreender na sua essência. (…) O estudo psicológico do mercado é também importante, (…). A maneira de fabricar, de apresentar, de distribuir e de reclamar um artigo varia conforme a índole geral dos indivíduos que compõem o mercado onde se pretende vendê-lo. Num meio de gente educada as condições são diferentes, para todos estes casos, do que num meio de analfabetos. Um meio provinciano - educado ou não - tem uma psicologia distinta da de um meio de cidade.”
“O modo de encarar a vida, ou, pelo menos, certos aspectos da vida, varia de país para país, de região para região. A humanidade, sem dúvida, é a mesma em toda a parte. Sucede, porém, que em toda a parte é diferente. É a mesma nas coisas essenciais, nos sentimentos fundamentais; mas, as mais das vezes, não são as coisas realmente essenciais que ela tem por essenciais, nem os sentimentos fundamentais que a preocupam como fundamentais. Em todos os tempos, em todas as terras, é o local, o superficial, o ocasional o que mais tem preocupado a humanidade. Ora é ao que mais preocupa a humanidade, e constitui, portanto, as suas necessidades, que o comércio essencialmente se dirige. E é por isso que o comerciante, que deveras o seja, tem para consigo mesmo o dever de estudar psicologicamente, e um a um, os agrupamentos humanos a que destina os seus artigos. (…)”
E é isto! A Wikipédia necessita de umas atualizações!
Boa semana!
Abraço,
Paula Ribeiro
Head of marketing and Communication at bloom up
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